CRÔNICA: É hora de voltarmos à luta



O dia 31 de agosto sacudiu o Brasil! Apesar de já ter sido decidido naquele fatídico 17 de abril, quando um “show pirotécnico” (a fala é dos principais jornais do mundo, desde o The New York Times de Nova Iorque, passando pelo El País da Espanha, considerado o maior jornal da Europa, até o Clarin da Argentina), foi realizado na Câmara dos Deputados, organizado e comandado por alguém que não merece a menor credibilidade do povo brasileiro.
Fato é que, desde o segundo debate entre Lula e Collor para Presidente da República no longínquo 1989, as massas organizadas brasileiras já não estavam mais dispostas a enfrentar a luta, partir para o fronte e ganhar as ruas.
Aquele debate selou a derrota de Lula e do povo brasileiro no segundo turno daquelas eleições. Lembro-me muito bem que nós ficávamos ouvindo/vendo Collor bater sem parar e, nosso futuro presidente encostado no ringue sem conseguir reagir, após o “tapa de luva” que a face mais turva do fascismo brasileiro deu, através de Collor (aquilo não foi ele que arquitetou, ele não tinha essa capacidade). Desde então, houve um sentimento de derrota geral e as pessoas arrefeceram. Só em 1992, quando os “Caras-pintadas” voltaram às ruas para derrubar o mesmo Collor por corrupção, é que houve uma retomada, mesmo que breve, da luta pela democracia.
Os anos seguintes foram de “calmaria”, e é na calmaria que os tubarões atacam. E atacaram ferozmente, levando por debaixo dos panos tudo o que era do Brasil: energia, comunicações, minério, dinheiro. Mas ainda não estávamos totalmente refeitos do golpe de 1989. E nessa balada fomos até 2002 quando conseguimos levar ao poder um legítimo representante do povo.
Foram treze anos e (quase) oito meses de uma vida de liberdade, direitos preservados, de fartura. Mas os abutres da democracia cobraram um preço alto demais na cadernetinha dos brasileiros. Cobraram não, estão cobrando e vão cobrar. É aquela bodega da fazenda do patrão, onde o trabalhador vai lá, faz suas compras para o mês e o bodegueiro (apenas um pau-mandado do patrão) cobra o dobro, de forma que o pobre sempre vai estar devendo na mercearia.
É hora de voltarmos à luta. As falas de Luiza Erundina na Câmara dos Deputados e Lídice da Mata no Senado clama pelo povo nas ruas. Ao tempo em que nos dá ânimo para não desistirmos.
É hora de retomar o caminho da luta. Estávamos desfrutando de tudo o que produzimos em 500 anos de história, mas tudo nos foi tirado em 17 de abril e a conta fechou em 31 de agosto de 2016. Um outro Brasil possível tem que ser retomado nos movimentos que também andavam meio adormecidos no “berço esplêndido” que se transformaram os últimos treze anos e meio.
Estamos cansados dos anos da vida. Mesmo porque, muitos de nós já não é mais criança e nem tem o vigor físico de trinta anos atrás. Mas o projeto de retomar o Brasil e devolver aos brasileiros (ou seja, a nós mesmos), interpela a todos nós para retomarmos o fronte.
Ontem não foi Dilma que caiu, foi o povo brasileiro que foi derrubado. Contudo, nós perdemos uma batalha, mas, como disseram os sandinistas na Revolução da Nicarágua, “a guerra não acabou”.
Lembro-me de uma música tema da Pastoral da Juventude do Meio Popular da Diocese de Afogados da Ingazeira, do ano de 1982, que renasce muito viva em nossos corações “Ainda que sangrando/ este povo há de vencer/ num país capitalista/ onde o pobre há de crescer”, não sei que é o autor, mas, com certeza, a ideia da letra retorna com toda força nesses temos sombrios que começaram de novo.
Sigo a belíssima frase da irredutível Dilma em seu discurso pós-consumação do golpe, no Palácio Alvorada ontem à tarde, que capturei no Tijolaço, Blog do incansável Fernando Brito, do poeta russo Maiakovski e reproduzo aqui:
”Não estamos alegres, é certo,
Mas também por que razão haveríamos de ficar tristes?
O mar da história é agitado
As ameaças e as guerras, haveremos de atravessá-las,
Rompê-las ao meio,
Cortando-as como uma quilha corta“.

Não estamos vencidos. É hora de voltarmos à luta.



Professor e brasileiro.